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Osamu Dazai - Declínio de um homem

Um dos livros mais angustiantes que eu já li, não somente pela veracidade que ele foi escrito, mas pelo quanto me identifiquei com as passagens, por bem ou por mal.
Acho que o romance de Osamu Dazai se diferencia de outros livros famosos pelos seus protagonistas autodepreciativos como "Lobo da Estepe" de Herman Hesse e "Memórias do Subsolo" de Dostoiévski na medida que o autor não tenta em nenhum momento se distanciar dele ao relatar suas dores, o Oba do livro é quase literalmente ele, apenas mudando o nome.
De verdade, eu tomei um spoiler gigante do livro por ler a página do Dazai na Wikipédia antes de ler o livro, porque essa obra é quase completamente autobiográfica, mas ainda assim ele sente a necessidade de mudar nomes e acontecimentos, para colocar uma fina barreira entre ele e a obra, e esse distanciamento pessoal, essa apatia é muito algo que Oba faria.
Mas ao basear a obra na sua vida e o personagem passar por suas situações, ele serviu quase como um diário para os sentimentos de Dazai em diversos momentos da sua vida, da intensa desconexão dele com outras pessoas, sua incapacidade de se relacionar com alguém, mesmo que levemente (inclusive mostrando algumas facetas um pouco machistas dele, mas enfim), e pra mim o mais interessante: como ele consegue viver a despeito disso.
Pra mim o ponto focal da obra não é necessariamente como o ambiente afeta o indivíduo, pois o próprio protagonista nasceu em uma família abastada e nunca teve reais dificuldades financeiras, então o foco não é na desigualdade social que pode acarretar no "Declínio de um homem", mas como a ideia de impasse na vida dele se desenrola através de sua vida, colocando em questão se ele realmente mudou desde sua infância, se as três imagens que se apresentam no início são três pessoas diferentes, ou a mesma com diferentes graus de honestidade em sua expressão, com o mesmo sentimento.
Podemos apontar dedos em várias direções tentando apontar qual foi o real motivo do desfecho do personagem: Seus pais que o negligenciaram, seus "amigos" que não o confrontavam, em suas atuações, não tentaram se tornar realmente íntimos, seu amigo Horiki que se aproveitou dele, ou até as diversas mulheres que passaram por seu caminho, querendo consolo ou o consolando maternalmente. Todas essas respostas válidas, mas o real agravante que permeia todas as suas experiências é o conforto, seja do próprio Oba ou das pessoas com quem ele se relaciona. Oba nunca pensou que necessitava mudar, não quer experiências extremas, felizes ou tristes, apenas o eterno cinza, como citou no livro:

"E então, na manhã seguinte, tudo recomeçava igual
Bastava apenas seguir os costumes da véspera
E quem pode evitar as grandes alegrias rudes
Naturalmente também evita as grandes dores
Como um sapo que contorna uma pedra em seu caminho"

Vale pensar que isso não seria um incômodo, que não traz nada de errado para ninguém viver assim, mas esse sentimento não é tão neutro quanto se pensa, pois ele não se situa no meio do otimismo e no pessimismo, mas é uma descrença na própria vida em si, provavelmente a melhor alusão de niilismo não é pessimismo mas essa falta de fé que o personagem sofre, pois sua vida não tem sentido por nunca se deixar acreditar em algo, quebrando cada promessa que já fez consigo mesmo antes da tinta da caneta esfriar, e se não existe fé em si mesmo, não existe fé no outro, e a empatia é impossível.
Mas Oba se recusa a confrontar isso, o fazer seria o perigo de sentir algo significante, diferente das imensas dores externas, seria olhar para si, e isso é impossível para ele, porque não existe "si" para olhar, pois ele não é mais humano. Por mais que as pessoas tentem ajudar e até mesmo refletindo suas próprias dores, ele é incapaz de mudar, e assim ele não vê motivo para sair do caminho que leva ao seu desespero, ficando completamente imóvel durante o processo, e o que mais doeu foi ver que eu posso estar no mesmo caminho.
Uma tragédia do início ao fim, eu nunca antes desejei tanto um filme ter um final feliz, mas assim como na vida de Dazai, essa não existe, mas mesmo assim é um livro extremamente atual e emblemático do pensamento de muitos jovens, apesar de ter sido escrito em 1948. Brilhantemente escrito e uma recomendação se quiser acabar com a sua semana.